21 maio 2008

Coisa de Gordo - 377


377 - PERGUNTA CAPCIOSA
Esta coisa de ATENDER pessoas, este dia-a-dia que preenche a vida de médicos, psicólogos, fisioterapeutas e tantas classes profissionais mais, tem lá os seus mistérios. E as suas armadilhas.
Ficar do lado de lá de uma mesa, levantar o rosto e dizer: - O que há com você? – é a senha para que se escutem coisas as mais loucas possíveis. Inusitadas. Inacreditáveis. Estupendas. Arrasadoras.
Não, não se anime, não pretendo aqui contar segredos que já ouvi. De uma forma mais segura, volto no tempo e falarei de uma vez, eu ainda jovem, quando sentei do lado de lá da mesa e fui consultar. Ainda não era médico. Recém houvera passado no vestibular. A conversa fluindo, as informações postas, eis que o médico de então larga a caneta e me olha fixamente. Sim, naquele tempo os prontuários eram à caneta, guardados em envelopes pardos, que ficavam naqueles arquivos pesadões. Por detrás de seus óculos ele respirou fundo e me disse: - Tem alguma coisa que eu não perguntei mas que tu queiras me dizer?
Passados vinte longos segundos, intrigado que fiquei, respondi negativamente: - Não, não...nada que me ocorra agora.
Pela vida afora, sempre carreguei esta pergunta comigo. Vez que outra, já do outro lado da mesa, arrisquei-me a fazê-la a pacientes. Mas a impressão que tive, independente do lado da mesa em que estivesse, é que esta era a senha, a chave que abriria um portal para abismos de individualidades. Ora, que coisa mais vaga, mais ampla, mais profunda, tudo ao mesmo tempo!
Volta e meia me peguei imaginando que tipo de resposta eu poderia ter dado. O que em nada interessaria a você, leitor (a). Uma vida sem graça como a minha em nada o interessaria. Mas imaginei também o que certas pessoas fictícias responderiam, em consultórios, diante de tal pergunta. E então, tem alguma coisa que não perguntei, mas que você queira falar?
CASO 1: RAPAZ COM CARA DE REBELDE, CHEIO DE PULSEIRAS E CAVEIRAS: - Ahn...o quê? Coisa que eu queira falar? Bom...O negócio é o seguinte. Tô de saco cheio dessa minha mãe! Ela fica me levando a médicos, psicólogos, terapeutas alternativos, sempre inventando que eu estou cheio de problemas! Cara, tô enlouquecendo!!! A veia tá descompensada! Desde que meu irmão largou a mulher, o emprego, a casa, o carro e os cachorros e se mudou para uma pousada em Ubatuba para viver feliz com o dentista dele, nunca mais ela se ajeitou! Fica me levando a consultas com motivos absurdos, inventa dores que não tenho, coisas que não fiz. Já disse a ela: - Mãe, eu sou homem e vou ficar em casa ainda muito tempo. Tira esse grilo todo da cabeça!...... (silêncio na sala de consultas...a mãe com os olhos esbugalhados se levanta e vai em direção à porta...o médico..atordoado.....permanece congelado).
CASO 2: MULHER LOIRA, QUARENTA ANOS, MUITO MAQUIADA: - Você quer saber se eu tenho alguma coisa para falar? ALGUMA COISA (ela grita)? Cara, eu tenho o mundo todo para falar. E não é porque este banana do meu marido está aqui que vou perder esta chance. Esse cara não me enxerga, não me quer mais, faz tempo que vive comigo num enorme sacrifício. Olha o jeito dele, esse olhar disperso para a janela...é assim que ele me trata! Eu faço de tudo...TUDO....e ele nem me olha. Já fui com ele a boates de swing, a cabarés, acredita que até em boate gay ele já me levou? E tudo isso para quê? Para NADA! Ele não quer mais nada comigo e fica inventando coisas e pessoas dentro da nossa relação. Aliás, nem sei se ainda existe relação. O que sei é que me esforço, ma rasgo, me dou o tempo todo e ele NADA! NADA!!!! ...(o grito ecoa na sala de espera da Psicóloga, a secretária e os outros pacientes se entreolham encabulados).
CASO 3: HOMEM DE TRINTA E CINCO ANOS, TODO PERFUMADINHO, DE TERNO: - Alguma coisa para falar? Deixa ver...ih, olha só, acho que vou aproveitar a chance e tirar este peso de meus ombros. Sei lá, não estou conseguindo segurar mais. Olha, acontece o seguinte. Eu sei que ela me pegou na pior, me tirou do negativo no Banco, me deu casa, comida, viagens à Paris, me pagou a faculdade, me deu o carro do ano em todos esses anos. Mas cheguei ao meu limite. O Senhor olhe para ela e veja se tem cabimento um cara como eu estar casado com essa senhora de sessenta e cinco anos!! Cara, tô ficando constrangido. Ela de fato passou a ser um peso em minha vida. Sei, sei, ela logo vai começar a chorar, ela sempre me chantageia assim, olha só, olha só, já começou. Pois atingi o meu limite! Chega! Chega! Já tenho meu apartamento, meu carro, uma profissão estável, quero viver a minha vida e não a dela! Olha, foi muito bom ter vindo aqui. Quero resolver isso logo, pois tenho um curso de línguas em Londres semana que vem e já quero viajar livre disso tudo. Livre dela! ...( a senhora grisalha seca discretamente uma lágrima, abraça-se à bolsa de couro em seu colo e engole em seco....mais tarde o zelador do prédio escuta um estampido dentro do elevador, ao chegar encontra aquele homem, de terno, com um tiro na cabeça...a polícia nunca identificou o “assaltante”).
E você aí, tem alguma coisa que não lhe perguntei, mas você quer falar?
Silvano – se expondo a perigos


LEITOR COMENTA OS ALAFAJORES E BOCADITOS
Caro Silvano, aSra. Delonir é velha conhecida dos Alfajores e Bocaditos da marca Punta Balena. Eventualmente, é encontrado em Porto Alegre, sendo que uma vez tinha até no Bourbon, mas em todos esses lugares que já os achamos em Porto Alegre, nunca os conseguimos uma segunda vez. Felizmente, nossos padrinhos e amigos Rômulo e Rose vão à fronteira com freqüência e trazem para a Sra Delonir uma caixa destes regalos, e às vezes, sobra um para mim, que aprecio muito, também. Não provamos os brancos a que te referes. Já em Buenos Aires, na tradicional Havana, a griffe do alfajor em terras portenhas, tem o branco, mas não é chocolate, e sim um tipo de merengue. Eu, particularmente, gosto. Na Medialuna Café, Rua Dr Timóteo com Vinte e Quatro de Outubro, além das próprias medialunas, que adoramos, tem também um pequeno alfajor, sem cobertura de chocolate e com um coquinho ralo e ralado por cima, que é uma delícia e uma fortuna. Em Buenos Aires, este mesmo pequeno Alfajor tem em qualquer padaria, esquina ou café e por um vigésimo do que custa em Porto Alegre. Parece que a bolachinha é de maisena... Segundo a Sra Delonir, Alfajores, independente de seu formato e receita, fazem o maior sucesso!! Na mesma quadra do café Medialuna, tem a tradicional Primavera, assim como os Afajores, lá em B.Aires, tem aqueles sanduichinhos maravilhosos por todo parte... e um Alfajor de sobremesa, completa o tudo de bom! Se eu começar a falar de comida e Buenos Aires... não paro mais. Abraços, James e Delonir.


22/05/2008

1 comentários:

Anônimo disse...

Uma das melhores meu caro Silvano. Uma mistura de realismo com bom-humor. Fantástico. Adorei! Bjs,Rosalva