20 dezembro 2008

Coisa de Gordo - 407


CG 407 – MAGRO QUE IRRITA
Há personagens do cotidiano que eventualmente invadem as páginas dos textos, momento no qual são descritos em prosa e verso. Já comentei neste espaço a expressão “Come e não Engorda” que o Luis Fernando Veríssimo cunhou anos atrás, aludindo àquele infeliz que come três vezes mais que você mas cujo número da calça é quase a metade do seu. Este é só um exemplo, haveria muitos outros a citar. Já cunhei eu mesmo o famoso TRANCA FILA, aquele outro fariseu que, na fila do Bufê, retarda todo o andamento do almoço por causa de uma folha de alface. E vira, e revira a alface, e nada de andar, e a fila ali, atrás dele, suspirando.
Trago hoje ao vosso exame mais um desses folclóricos seres da vida diária. Hoje falarei do MAGRO QUE IRRITA. Daqui por diante, citado no texto pela sigla MQI.
Estávamos no local de trabalho, alguém farejou que no segundo andar estava rolando um convescote, um rápido coquetel em que havia salgadinhos, docinhos, tortas, etc. Uma colega nossa, infelizmente magra, ofereceu-se para ir até lá buscar uns docinhos. Ela disse exatamente isso: - Vou lá buscar uns docinhos. Minutos passados, ela volta de mãos abanando e sentencia: - Os docinhos tinham acabado. Só sobrou salgadinhos e uma tortas. Não trouxe nada! Quase matamos a mulher. Isso é uma demonstração de MQI.
O MQI não nasceu magro apenas nesta vida. Nada disso. Ele fez uma regressão a vidas passadas e descobriu que sua encarnação mais “gorda” foi como trapezista num circo italiano. Fora essa, desde o tempo das pirâmides ele veio nascendo com aquela estatura franzina.
O MQI tem um IMC baixo, em geral em torno de 16 ou 17. O tamanho de suas roupas gira em torno do 38, máximo de 40. Você encontrará exemplares do MQI em todos os sexos, ele não tem predileção de gênero.
Dentro da área médica, o MQI tende a fazer a especialidade de Endocrinologia. Não que não existam endocrinologistas normais ou mesmo gordos. Mas se o estudante de medicina é um MQI ele se interessa pelo estudo das glândulas e dos hormônios. E passa e sentar olhos sobre os males que afligem a humanidade de hoje, a obesidade e o PT (desculpa, não resisti à piada – tomara não tenha perdido amigos). E ali, no sair do curso médico, o MQI dedica-se a fazer sua especialização justamente nesta área. E doravante, em sua labuta diária, ele vai conviver com gordos que o buscam para saber como emagrecer. E na hora da entrevista médica, após o pobre paciente ter delineado toda a sua maratona alimentar diária, o MQI largará sua caneta, tirará o óculos do rosto e lançará aquele olhar de desdém. Feito isso, ele emitirá um longo suspiro, seguido de uma pergunta irritante. Por isso o nome dele é Magro que Irrita. Diz ele: - Por que você tem esta mania de comer arroz junto com lasanha?
Impressionante a crueldade do MQI ! Ele por vezes não mede suas palavras.
Você trabalha numa empresa de comércio, nesta época do ano os pedidos se avolumam, as turmas de trabalho se revezam fazendo turnos. Lá pelas tantas você tem um intervalinho, reúne seu grupo de trabalho e pergunta: - E aí, vamos almoçar pastel ou churrasquinho? Antes que alguém responda, o MQI do grupo se adianta e sacramenta: - Prá que almoçar? A gente podia jogar uma canastra ou mesmo dar uma sesteadinha. O grupo todo silencia ao redor dele, um dos gordos mais exaltados se aproxima para tentar dar uma chave de braço, mas é contido pelos outros. A rodinha se dissipa, cada um vai buscar seu próprio almoço resmungando. Sem se dar por vencido, o MQI se oferece então para ir junto com todos até a lancheria da esquina.
Já na Lancheria do Vadão (o rei do Pastelão), o MQI começa a buscar sociedade com alguém para comer um terço de pastel de carne. Mais que isso me incha o estômago – ele explica com cara de dor enquanto massageia a barriga. Como todos se esquivam, pois pedem dois ou três pastéis cada um, o MQI desiste de comprar e começa então a pedir só uma lasquinha do pastel de alguém. O gordo aquele da chave de braço agora tem que ser levado para a rua! Quase que a coisa engrossa.
No seu dia-a-dia você deve conviver com algum desta espécie. É daqueles que pára a uma hora da tarde e lhe pergunta, na maior cara de pau: - Você lembra se eu já almocei hoje?
No amigo-secreto de fim-de-ano ele ganha de presente um passaporte para comer DEZ vezes na Pizzaria mais badalada da cidade. Aí ele olha o presente, faz aquela cara de desmazelo, passa a mão na barriga, sacode a cabeça negativamente e senta desolado.
Que coisa mais irritante, esse MQI ! Que cara mais auto-suficiente! Que cara mais magro!
Pois é, a nós, mortais, resta ver e sofrer.
Me passa a Rabanada!
Silvano – o impossível

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